sexta-feira, 3 de outubro de 2008

CARTA FANTASIA


CARTA FANTASIA I (11/04/2000)

As luzes se movem
entre pensamentos
e reflexos sem ordem
de uma hora azul
figurando o amém
sendo poeta do não
vendo o ser da razão
o morno de algo ação
flertes de amor colorido
como e como palavras
de ternura e sabor
as luzes se apagam
a noite cai, vem
o vento flui, como o vermelho
e tudo voa no pensamento
de ser e não ser
cantarolando um verso
balbúcia de rimas
declamação de teorias
eixos e não eixos da luz
ser poeta do nada
rimar o inexistente
a noite flui, calma
a máquina de escrever
se evapora na saudade
uma saudade inexistente
como tudo na poesia
do poeta noturno
que não sabe distinguir
a diferença entre o mundo
e o calor de um afago
a luz brilha reluzente
a visão do meu tédio
a vontade de sorrir
ou de proferir uma rima
no vento de ser poeta
na vontade de ser o melhor
mas na prática ser o pior
como ondas que não se cansam
de subirem e descerem
sem fugir a regra
sendo sempre o mesmo
a noite vem a apagar
o vento corre como leite
a máquina vira uma carta
as fichas se misturam
como da vida a hora “H”
com chances de ferir
encerro a carta fantasia.

CARTA FANTASIA II

A lua vibrava e eu rolava
a caneta sumia entre rosas
morria um poeta de grito
mas à luz brilhou com trincos
de imediato apagando a pomba da paz
eram presas as letras da censura
ela voltava, voltou...
nós loucos por se expressar
calma coração não pare
antes do último grito
pois a vida é fraca
tudo é frágil, o sangue corre
o papel se apaga, a caneta é falha
os dígitos da mente se somem
e eu digito: sou a loucura dos loucos
mas a crítica flutua
e eu não passo de um pobre
os ricos se matam
como poeta eu choro letras
as flores se vendem
chamas se calcificam
é a apologia da loucura
é o apocalipse inválido
mentes de algodão
sementes de poesia
assim me pedem inspiração
me encomendam um poema
sobre os perfeitos
(mas como posso tanger o mar
se meus pés são âncoras de bronze?)
pulo e viro a bordo da máquina
a única via de liberdade no mundo
vem provérbios, vem cismas
e tudo me mostra a carta fantasia.

CARTA FANTASIA III

O chão treme e eu grito
penso em pular
tudo fica torto
os pupilos se curvam
ergo a minha espada
pronto para o combate
os navegantes invadem a loucura
os curiosos brigam por liberdade
mas eu fito de longe
os guerreiros se posicionam para a guerra
os piratas invadem a ilha ilusão
os exércitos da sabedoria
partem rumo a inércia
e eu fito de longe
um guerreiro solitário
todos se encontram no campo imaginário
numa guerra de pensamentos
eu me aproximo para retratar o acontecimento
e sou baleado com um verbo mal rimado
no final todos perdem
mas à guerra não acaba
como nunca acabará
e os pupilos, navegantes, curiosos
formam o reino dos revoltados
os guerreiros, piratas, exércitos da sabedoria
unificam-se como o grupo das ciências
mas vejo longe, bem longe
um guerreiro solitário
e só eu saio vivo
para versificar a carta fantasia.

CARTA FANTASIA IV

Preparo a carta fantasia IV
pego uma folha na gaveta
olho para o rato que passeia nas telhas
sinto a escassez de ser rigoroso
fazendo uma arte livre.

O ar era morno
os insetos piscavam
num instante vi a máquina
que se apresentava para mim
e pedindo sua alforria
sorri e dei um tiro em sua fonte
as pessoas correram atordoadas
e eu fugi rumo aos que brincavam
com uma bola de neve
e de repente começaram a atirar
vários caíram baleados
e eu empunhei minha arma
mas não houve jeito.

Beijei a face de uma deusa
era deusa mesma.

O aroma que exalava era trépido
uma folha tremia em minhas mãos
pensei ser uma carta
(esta minha psicose por cartas)
mas não, era um poema
(notei pela disposição das palavras)
no início, na margem esquerda
estava escrito
a carta fantasia.

CARTA FANTASIA V

à beira de um colapso biológico
os escolhidos decidiram que o nada seria melhor
e nos tornamos refém do virtual
nossas raízes se desprenderam do passado
e a loucura tomou conta das verdades
e os anjos com o domínio total
lancei-me a contestar minha sanidade
protestei com as ferramentas que possuía
não sobrou em quem confiar
apenas entendi que se tudo não valia a pena
deveria jogar aquela partida de xadrez
mesmo com meus cavalos truncados

lá pelas quantas entendi
a superficialidade do entendimento humano
e o efeito do narcótico começou a desaparecer
e se tudo não era mais verídico
a busca desesperada chegava a seu fim
finalmente estava livre para retroagir
até a minha idade negativa
até o antes do nada

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